terça-feira, fevereiro 12, 2008
Imagem: Fellatio, Isis/Osíris.
A CHUPÓLOGA PAPA-JERIMUM
Luiz Alberto Machado
A noite e a solidão me vinham duma só vez. Enquanto descia a calçada da praia com o vento incendiando o irrevelável no sopro dos cabelos aureolados, também juntas vinham todas as imagens mais inimagináveis e desconexas, soltas e desconcertantes no juízo, se alojando desde o mindinho do pé ao topo da cabeça.
Fui, então, me arvorando a passear solfejando à toa pela paisagem convidativa. De repente, quando, ao longe, com o barulho das águas do mar luzidio e os reflexos da lua em noite cheia, e a minha noite solitária seguia o olhar palpitante daquela que se parecia ao longe uma coisa que se vê quando vai e não volta nunca mais, tomando da lua a luz das estrelas e a emoção alvoroçada que saculejava minhas veias adentro, até sentir-lhe de longe o mormaço etéreo do seu ser sobre a minha cobiça desenfreada.
Ah, que a noite era mais longínqua que a sensação de tê-la bem pertinho e provar do seu oxigênio restaurando minha vitalidade de quase morto perdido nas sequelas e adversidades calejadas de quem sabe o mundo ao alcance da mão e lá léguas muitas depois.
Ah, como ela era bela com a sua face de lua impune e sedutora, uma princesinha chocha que enamorava a minha afeição para quem a vida alentava e salvava do escanteio compulsório de sempre na esgoelada e lúbrica arranhada da voz sob o tormento que me açodava a possibilidade de apertar-lhe as mãos doces monóicas pela força de poder no jeito de agasalhar a minha hora de fragilidade, temperamentalmente fêmea e reluzente, decididamente determinada a alcançar o seu querer, enquanto eu timidamente apenas acendia o meu querer-lhe a qualquer custo.
Ah, como ela era terminantemente do tamanho que toda minha querência podia ser premiada enquanto ela, do outro lado da rua, não largava o meu olhar, nem eu ao dela, sabia, conhecíamo-nos naquela hora, aliás, nem nos conhecíamos, ainda, apenas descobríamos o momento que flagrávamos ali na captura e nenhum gesto fora necessário para que ela atravessasse com firmeza de caçadora sagaz a rua que distava entre o meu desejo e o dela, quando se acercava da minha inércia, divisando-me rente ao seu cheiro de terra florida a dar-me paz no meu desconserto intranquilo, de perceber o nosso tremor de desejo na carne adente.
Ah, como seu lábio rubro e pronunciado com todos os tentáculos feminis de absorver minha sanha louca e de abarcar minha sede num beijo transcendente com o gosto da paçoca do pilão de Pirangi do Norte, da tapioca com ginga na Redinha, da guaiamunzada na Barra do Rio, do grude de Extremóz. E voávamos sobre as dunas de Genipabu enquanto a rua repleta de frinfras & garbosos & petulantes & de nada & de mentirinha de ontem e de hoje & testemunhavam nossa loucura obscena e radiante rasgando nossas vestes & carcaças & intimidades descobertas naquela iniciação, com as minhas mãos buliçosas manuseando suas margens, seus contornos, seu território, sua reentrância, sua curvilínea geografia.
Imagem: Kama Sutra, Chumbitaka.
Ah, era bom demais de íntimo para ser público na calçada da praia, eu levado, ela conduzindo meu faro de cão sedento e desvalido, até a alcova dos sonhos que eu não sabia existir jamais para que minhas mãos pudesse tocá-la mais na areia fininha da clarividente água do seu corpo, e eu pudesse beijar suas coxas em brasa e sentir-me a volúpia de sua alma e seu agridoce ventre e o incenso de sua carne ardendo suas chamas que carbonizavam o meu querer, a seguir-lhe as pegadas, tonto, cego, entregue e sorvendo a totalidade do seu ser desnudado na rota do sol e eu me enfiando pelo seu Morro do Careca de Pontanegra, servindo-me do seu circo de Búzios, dominando seu jeito de golfinho de Pipa, degustando da suntuosidade de seu Cotovelo, mergulhando na profundidade de sua ilha de Galinhos, até saber-me impregnado por seu olhar maravilhoso de por do sol do Potengi com sua balsa na Igapó lá no fundo levando toda a minha consciência para nada mais saber de nada de nada de nada & nada.
Fui usurpando a sua barreira do inferno que é o céu e o purgatório e todas as celestiais camadas da eternidade mais finita das infinitudes que estonteiam a cosmogonia de semi-deuses, pseudo-deus feito eu, até provar do orgasmo no cajueiro de Pirangi do Norte.
Ah, eu me deleitava e não mais sabia de nada, a vida era ela, meu sopro vital e mais nada e mais nada me interessaria a esta altura, quando tudo era lindo e celestial no ápice da minha crença oculta.
Ah! E onde estávamos não sabíamos, nem seu nome nem de mim nem da nossa comunhão de tudo e nada, eu jogado como um navio errante de Rocas e ela a água imensa do Atlântico levando-me pelo oceano adentro até Pacíficos & Índicos & mais até onde nem mais sabia além de céu e mar, apenas, enquanto eu me sentia submerso em seu segredo porque ela roçou-me com sua língua reptante os meus músculos toráxicos, o umbigo e o declive das intimidades sondadas com seu faro e seu toque palatar no encontro da coxa e do ventre acercando-se do meu cordão sacralizado e lambendo-me a superfície da minha pontiaguda efervescência e abarcando-me a glande e engulindo rijo na felação de sua caverna até a abóbada palatina mais estrelada com o cometa da língua solta a lambuzar-me de seu sobejo mágico babando abundantemente até acender-me a vida. E tudo era tão mágico quanto exótico de prazer ao chupar-me levando de mim todas as posses que reconditamente ainda poderia possuir todas as latências, toda existência e apropriando-se da totalidade de mim que a partir de agora era levado pelo seu ansioso poderio de mulher insaciável.
Imagem da artista plástica argentina Sandra La Porta.
Ah, como fizera de mim reduzido a ser apenas o macho que transferia toda sua vitalidade para a sua vampiresca necessidade de se apoderar de toda conformação de menino homem feito que nunca ficou adulto de envelhecer como uma criança que não sabe o tempo que passou e que passará e já nem se dará conta que o sisifismo se faz imanente até o labirinto do átimo paradoxal.
Ah, era ao mesmo tempo a minha fortaleza restituída, a minha inutilidade restaurada para algo maior que minhas próprias proporções, do que me levava e exauria, resultando a minha segunda pele hercúlea, poderosa, remoçada e viril duplamente satisfeito nas mais íntimas necessidades.
Era o espetáculo da entrega onde a posse era despossuída e a servidão era a completa interação entre a deificação da carne e a dessacralização da alma.
©Luiz Alberto Machado. Direitos reservados do autor.
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